As crianças portuguesas passam, em média, cinco horas sentadas à secretária na escola. Os recreios são poucos e curtos e, muitas vezes, chegam a casa e continuam a fazer atividades pouco ou nada ativas: sentam-se em frente à televisão ou ao computador e ali ficam, sossegadas e estáticas. Resultado: carecem de uma componente muito importante para o seu crescimento saudável e desenvolvimento adequado. Falta-lhes mexerem-se, saltarem, correrem, esticarem-se, esfolarem os joelhos, suarem. Falta-lhes exercitar os músculos, a coordenação motora, o equilíbrio, a concentração e até os neurónios! Porque não é só a saúde física que está em causa: é sabido que os alunos que fazem exercício físico têm melhores resultados escolares. Esta é a conclusão de um estudo realizado por investigadores da Faculdade de Motricidade Humana (FMH), que envolveu três mil alunos ao longo de cinco anos.

Toca a Mexer!

Luís Bettencourt Sardinha, diretor do Laboratório Exercício e Saúde, da FMH, e coordenação do estudo, confirma que “a variação do dispêndio energético pode influenciar algumas estruturas cerebrais e respetivas funcionalidades com impacto nas funções executivas e no rendimento escolar das crianças”. A investigação que coordenou sugere exatamente isso: “A aptidão aeróbia e o excesso ponderal estão associados de forma independente e conjugada com o crescimento escolar das crianças portuguesas”. Numa altura em que tanto se valoriza e ambiciona o sucesso escolar, valerá a pena investir tempo (mais até do que recursos) num aspeto tao simples, mas tao importante como o exercício físico. Correr, jogar à bola, saltar… Numa atividade organizada ou espontânea, o importante é que se mexam com vigor. Pelo menos 60 minutos por dia. Ora é exatamente isto que não está a acontecer na atarefada vida da maioria das crianças portuguesas. Por isso, além de desatentos nas aulas, têm maiores riscos de serem pré-obesos ou obesos.

“O exercício tem um marcado impacto na saúde cardíaca e vascular, em diferentes domínios do metabolismo com impacto, por exemplo, no desenvolvimento ósseo, na redução da resistência à insulina e respetiva redução de prevalência e incidência da diabetes tipo 2, na melhoria do metabolismo das gorduras e em muitos outros fatores salutogénicos”, salienta Luís Bettencourt Sardinha, lembrando que a mudança de comportamento, nomeadamente através de “iniciativas individuais que viabilizam o aumento do dispêndio energético, podem influenciar as dimensões fisiológicas e psicológicas determinantes no crescimento e no desenvolvimento das crianças.

Toca a Mexer!

Vamos ao parque?

É fundamental que os pais inventem tempo para ir com as suas crianças á rua, ao parque, que as deixem correr livremente, subir às árvores, escalar os muros e explorar o mundo à sua volta, que as incentivem a experimentar o skate, os patins ou as trotinetes sem medo que partam a cabeça (há capacetes para isso). Que os incitem a sair da redoma e a crescer mais livres.

É essencial promover “a educação corporal desde o nascimento e durante todo o ciclo de vida”, diz o investigador da FMH, sublinhando que, além da família, “os contextos pré-escolar e escolar têm uma função determinante no desenvolvimento da educação física e da promoção da atividade física e desporto”.

Toca a Mexer!

As mais recentes recomendações da Comissão Europeia nesta matéria reconhecem “a função determinante da Educação Física para o desenvolvimento da literacia corporal no âmbito dos atributos físicos, neuromotores, psicológicos e sociais”. De uma forma mais explícita, adianta Luís Bettencourt Sardinha, “a décima recomendação sugere que sejam disponibilizadas às crianças europeias pelo menos cinco horas semanais de Educação Física formal”. Para este especialista, trata-se de um “reconhecimento importante identificando o valor desta disciplina para o desenvolvimento das crianças e para a preparação da formação desportiva”. E nesta área, Portugal está “bem preparado para o cumprimento desta recomendação, já que possui no sistema educativo professores com formação específica, bem treinados e qualificados para o ensino da Educação Física”. Falta “apenas” alterar calendários e colocar em prática estas recomendações. O que poderá não ser assim tão simples, tendo em conta que a carga horária escolar é cada vez mais pesada. E isso reflete-se na progressiva redução dos recreios, um espaço que o também investigador da FMH Carlos Neto considera “absolutamente fundamental” para a saúde mental e física da criança. “O recreio escolar é o último reduto que a criança tem durante a semana para brincar livremente”, afirmou recentemente ao Observador, lembrando que existe entre as nossas crianças um “analfabetismo motor” preocupante. “É um problema que deve preocupar toda a sociedade”, concorda Luís Bettencourt Sardinha, acrescentando que “o maior desenvolvimento intelectual e conhecimento das novas gerações de crianças pode ainda ser mais otimizado com a manutenção e desenvolvimento de muitas das competências motoras naturais das crianças”.

O exercício deve, por isso, “ser encarado como insubstituível para um apropriado crescimento e desenvolvimento humano”. Assim, se já acabou de ler este texto, não perca mais tempo: está na hora de pôr os seus filhos a mexer!

Toca a Mexer!

Fonte:

Pais & Filhos, número 297, outubro 2015

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