Este é um tema frequente nas consultas de obstetrícia… Não, as grávidas não são umas libidinosas incontroláveis, mas a verdade é que, ente as suas listas de receios naturais, entre o querer saber se podem comer caracóis ou manter a aula de Pilates, também querem saber se podem manter a sua atividade sexual regular.

“Regular? Disse “regular”??? Sim e foi intencional. Podia ter dito “normal”, mas a atividade sexual de uma mulher não tem que seguir uma “norma”, se é que existe tal coisa neste campo. Regular para cada mulher… regular para si: a sua regularidade de frequência, a sua regularidade de forma, porque possivelmente não lhe apetecerá o mesmo número de vezes que à sua prima ou à sua melhor amiga, e eventualmente também poderá achar menos graça a umas práticas, em favor de outras. Entendido?

Sexo na Gravidez: É Possível e Recomenda-se

Na grávida, habitualmente o que levanta mais dúvidas é a possibilidade de poder haver algum risco na relação sexual com penetração vaginal pela convicção de que tudo se passa muito “perto” do local onde está o bebé, ou ainda pelo receio de que o orgasmo, que acontece com pequenas contrações uterinas, possa de alguma maneira comprometer a segurança da gravidez. A resposta a estas questões é muito simples: desde que não haja sinais de alarme, nada está proibido!

Mesmo com esta afirmação, muitas vezes o casal, com algum receio do risco de aborto no primeiro trimestre, enquanto não está ultrapassada a barreira que se projetou para as 12 semanas como a “saída de zona de maior perigo”, retrai-se de alguma maneira e evita a relação sexual convencional. Mais: a ajudar as suas precauções, a própria grávida, mesmo que esteja com a líbido em “alta”, passa por uma fase de sono e perda de iniciativa que tornam difícil que “algo” aconteça!

Sexo Sem Riscos e Com Imaginação

“Apetite” imprevisível

Nesta fase, o comportamento da grávida relativamente a estes apetites é um pouco imprevisível. Com a exuberância hormonal a que está sujeita pode dar largas à sua sexualidade em pleno, como que festejando a dádiva da maternidade, ou pode, pelo contrário, porque anda nauseada, com o peito sensível e com o humor instável não querer sequer sentir próximo o seu parceiro!

Com frequência, nas primeiras semanas de gravidez, ocorrem algumas dores pélvicas, ao “fundo da barriga”, que mais não traduzem que o crescimento do útero e o aumento do fluxo vascular a essa zona, mas, porque fazem lembrar as dores do período, acendem-se todos os sinais vermelhos… e qualquer contacto é logo evitado. Assim, mesmo que o desejo esteja presente, por receio, por alterações físicas ou porque o corpo parece não querer colaborar com frequência o primeiro trimestre é uma travessia do deserto na área da sexualidade. Já o segundo trimestre é, a maior parte das vezes, o acordar para a vida!

O sono excessivo está a passar, a grávida recupera energia e iniciativa, as náuseas começam a dar tréguas e, sobretudo, o casal enche-se de confiança porque a fase de risco já lá vai… E aí, sim, é a retoma da cumplicidade, do toque, do contacto físico sem restrições. A grávida ainda não tem o seu corpo muito alterado, o que preserva a imagem feminina que tem de si, e a própria mobilidade ainda não está condicionada. Pode praticar tudo o que lhe apetecer sem restrições e sem grandes adaptações.

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Menos disponível

E o terceiro trimestre? Depende… Na fase inicial, se a grávida mantiver a sua agilidade, o peso controlado e não se sentir ainda demasiado pesada ou limitada na sua mobilidade, nada a impede de prosseguir o seu ritmo habitual. Quando começa a ficar mais volumosa, inchada, cansada… com frequência começa a ficar menos disponível para os prazeres da carne… Instalam-se de novo receio como o risco de um parto prematuro, até porque contrações começam a ser um acontecimento habitual no seu dia a dia. Não são ainda as contrações que iniciam um trabalho de parto, mas põem muitas vezes a grávida “em sentido”, temendo o que possa acontecer a seguir.

Também o ver-se inchada, com uma barriga muito grande, algumas vezes com varizes na zona da vulva, fazem-na colocar em questão a sensualidade da sua imagem e por vezes não há autoestima que resista a estas transformações. No entanto, não é raro o obstetra incentivar a atividade sexual nos dias que precedem o parto e, apesar dos pesares, nem que seja por um bem maior, há que cumprir!

Porém, isto faz pensar: se a intenção deste incentivo à atividade sexual é fazer com que a natureza acelere um pouco os mecanismos para entrar em trabalho de parto… então afinal há risco de que algo aconteça quando se pratica?!

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Há ou não risco?

Há substâncias que se associam ao início do trabalho de parto e que estão presentes no esperma e no colo: as famosas prostaglandinas. Duas a quatro horas após a relação sexual estas atingem níveis muito superiores ao normal e podem provocar contrações. Para que isto aconteça, o útero tem que ter uns recetores onde elas se liguem e estes vão aumentando ao longo da gravidez – daí a maior ação das prostaglandinas perto do parto, altura em que existe já a contraceção máxima de recetores no útero.

Assim, nada de pânicos, em circunstâncias normais nada acontecerá, nem mesmo com o aumento de prostaglandinas, após a relação sexual! Também mais perto do parto o toque dos mamilos poderá levar à libertação de ocitocina, desta forma provocar algumas contrações… Se existir uma situação de ameaça de parto pré-termo, nada de tocar no peito…

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Sem riscos, nada está proibido

Isto leva-nos para o que disse inicialmente: nada está proibido desde que não haja sinais de alarme. Estes, serão detetados pela grávida ou, se isso não acontecer, será o obstetra a definir. A própria grávida perceberá, se tiver perdas de sangue por via vaginal, por exemplo, que esse é um sinal que pode ser preocupante e dessa forma com certeza procurará evitar o que quer que seja que, quanto a ela, possa aumentar o risco de repetir esse acontecimento. Falando com o obstetra, ele confirmará a necessidade de repouso e, por esse motivo, a proibição de atividade sexual.

Outros exemplos de fatores que podem impedir a atividade sexual são a história anterior de parto pré-termo, gravidez gemelar, ou incompetência cervical, embora não haja provas irrefutáveis de que a relação sexual seja uma agravante nestes quadros. Finalmente, a placenta prévia após as 26 semanas também é uma presença ameaçadora para que se permita que possa ocorrer uma relação sexual com penetração vaginal.

Vendo bem e feito o balanço na maior parte das vezes não há restrições médicas e, quando são as circunstâncias que são limitativas, há que puxar pela imaginação para as contornar e até rir delas!

Enjoou o perfume do parceiro e não hora de se encostar ao peito dele não aguenta? Se nem um encosto consegue aguentar, como seguir com o resto?! Quer um truque? Ele que tome um duche com os seus próprios produtos de higiene e no fim dê uns borrifos com o seu perfume, por muito feminino que seja! Não aguenta o sono e enquanto ele lava os dentes já adormeceu? Combine deitarem-se mais cedo ou… jantem mais tarde! Só se já houver filhos mais velhos é que terão de usar mais criatividade… O obstetra não a quer deitada sobre as costas? Por favor… puxe pela imaginação!!!

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Brincar e partilhar

Os truques para manter uma vida afetiva satisfatória para o casal passam por conversar abertamente quer sobre as dificuldades e a forma de as ultrapassar, quer sobre o que lhe dá prazer. Brincar com as situações e perceber que as dificuldades são transitórias e que são inerentes à realização do projeto comum que é terem um filho são atitudes que constituem mais de meio caminho para ultrapassar eventuais dificuldades. A partilha dos problemas e a procura conjunta de soluções que aumentem o conforto e o prazer do casal terão de estar sempre presentes para que tudo funcione.

O “funcionar” pode não ter de passar por uma relação tórrida, mas o toque com carinho, com ternura, poderá ser tão satisfatória nesta altura como quaisquer outras manifestações. Não há apenas uma forma de prazer e talvez esta seja uma fase em que o casal poderá descobrir-se e descobrir outras formas até aí não exploradas ou sentidas.

Quanto ao bebé… Acreditem que este não tem nada a opor a que os pais se sintam bem. Pelo contrário, do ponto de vista químico um orgasmo fará com que sejam libertadas neurotransmissores que chegarão até ao bebé e esse sem saber como nem porquê seguramente sentir-se-á extremamente bem!

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E após o parto?

O período de pós-parto é uma fase delicada na vida da mulher no que se relaciona com a sua atividade sexual. Muitas tiveram uma episiotomia no seu parto e o medo de que a sua reparação tenha deixado sequelas, que diminua a elasticidade da vagina ou simplesmente que doa, é uma nota comum. Para além disso, muitas vezes o momento de retomar a atividade sexual é adiado pelo cansaço, privação do sono e até pela instabilidade do humor frequente nesta fase. A secura vaginal é outra dificuldade a ultrapassar, associada ao clima de privação de estrogénios típico da amamentação ou da toma da pílula adequada para esta fase, mas que com a utilização de um lubrificante fica para trás. A resolução destas dificuldades passa pela desvalorização do medo e o recurso a pequenos truques que permitam alguma recuperação do sono e cansaço. Em última instância, tudo dependerá da serenidade com que o casal encara esta pequena maratona do pós-parto!

Fonte:

Marcela Forjaz, ginecologista

Pais & Filhos, número 301, fevereiro 2016

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