O aparecimento de manchas na pele, sendo uma situação frequente em crianças é, por isso mesmo, uma causa frequente de visitas ao médico e aos serviços de urgência dos hospitais.

Várias dezenas de doenças podem provocar manchas na pele e a sua gravidade pode ser muito diferente. Vamos hoje rever as mais importantes. O objetivo não é que os pais saibam fazer um diagnóstico mas que estejam familiarizados com as situações mais frequentes. É fundamental que saibam que as manchas não são todas iguais e em que situações a criança deve ser vista por um médico. Aqui ficam algumas explicações.

manchas na pele

Há doenças e doenças

Existe um grande número de doenças que podem provocar o aparecimento de manchas na pele de uma criança. De entre elas é importante salientar dois grupos pela sua maior frequência ou importância:

  • Doenças virais (exantema súbito, eritema infecioso, rubéola, sarampo, varicela)
  • Doenças bacterianas (escarlatina, febre da carraça, sépsis)

É importante que os pais saibam fazer algumas distinções entre diferentes tipos de manchas para que não entrem em pânico sempre que alguma delas aparece.

Exantema súbito

O exantema súbito é provocado por um vírus (HHV -6), que se propaga por via respiratória ou oral. Após a criança contrair o vírus, este fica em incubação por um período de cinco a 15 dias até que surge febre elevada, que dura cerca de três dias. Apesar da febre ser alta, a criança não parece habitualmente muito incomodada. Ao 4º dia a febre desaparece bruscamente e surgem manchas rosadas e arredondadas no tronco que desaparecem ao fim de dois dias. A sua principal complicação é a possibilidade de ocorrer uma convulsão febril no período inicial da doença.

  • A criança só é contagiosa enquanto tem febre.
  • O tratamento consiste em baixa a febre, nos primeiros dias de doença. Não são necessárias quaisquer medidas em relação às manchas na pele.
  • Quando ficar sem febre a criança pode voltar à escola, mesmo que ainda mantenham as manchas.

Eritema infecioso (quinta doença)

O eritema infecioso é também provocado por um vírus (Parvo vírus B19) que se transmite por via respiratória (tosse ou espirros). Após um período de incubação de 4 a 14 dias a criança sente-se doente e pode apresentar dores de cabeça, dores de garganta ou uma febre baixa. Depois surge o exantema, inicialmente nas bochechas, que se tornam muito vermelhas, como se a criança tivesse sido esbofeteada. Em seguida surgem manchas arredondadas e rosadas que se espalham por todo o corpo. Nesta fase a criança já está bem-disposta e as manchas desaparecem em sete dias, sem deixar qualquer marca. As manchas podem acentuar-se com o exercício ou o calor (por exemplo, no banho).

A criança é contagiosa apenas nos dias antes de aparecerem as manchas.

Não é necessário qualquer tratamento específico. Nos primeiros dias de doença, antes de aparecerem as manchas, pode ser necessário administrar um antipirético. A evicção escolar não é necessária. A partir do momento em que surgem as manchas na face, a criança já não é contagiosa.

Rubéola

O vírus da rubéola transmite-se por via respiratória (tosse ou espirros).

Em metade dos casos a infeção não provoca quaisquer sintomas (assintomática). Pode existir febre, mal-estar e aumento dos gânglios do pescoço ou atrás das orelhas. As manchas no corpo (exantema) surgem inicialmente na face, progridem gradualmente para o tronco e membros e duram três dias.

  • A criança é contagiosa desde sete dias antes até sete dias depois do aparecimento do exantema.
  • Não há tratamento específico para esta infeção. A criança deve ser mantida hidratada e a febre tratada com paracetamol.
  • Não deve ir à escola até sete dias depois do aparecimento do exantema. Estas faltas são obrigatórias por lei. A criança só pode voltar à escola com uma declaração médica que ateste a cura da doença e a ausência de perigo de contágio. É importante evitar o contacto entre a criança doente e mulheres grávidas não vacinadas para a rubéola.

A rubéola é prevenida por uma vacina que faz parte do Programa Nacional de Vacinação. É uma doença inofensiva e sem complicações para a criança e o principal objetivo da vacinação é impedir a infeção de mulheres no início da gravidez pois a doença pode ter consequências graves para o feto, incluindo atraso mental, cegueira e surdez.

Sarampo

O sarampo é hoje uma doença muito rara em Portugal pois é protegida por uma vacina que faz parte do Programa Nacional de Vacinação.

O vírus do sarampo passa de criança para criança por via respiratória (tosse ou espirros). Após uma incubação de oito a 16 dias a doença inicia-se como uma constipação com secreções no nariz, tosse, conjuntivite e febre que se vai agravando. Dois a quatro dias surgem as manchas na pele (exantema), inicialmente na fase, mas rapidamente espalhando-se a todo o corpo poupando as palmas das mãos e as plantas dos pés. O exantema dura quatro dias e desaparece gradualmente com descamação fina da pele. O sarampo pode ter complicações graves como pneumonia ou meningite.

  • A criança é contagiosa desde quatro dias antes e até quatro dias depois do aparecimento do exantema.
  • Também não há tratamento específico para esta infeção. A criança deve ser mantida hidratada e a febre tratada com paracetamol.
  • A criança deve faltar à escola até quatro dias após o aparecimento do exantema. É obrigatório por lei. A criança só pode voltar à escola com uma declaração médica que ateste a cura da doença e a ausência de perigo de contágio.

Varicela

O vírus da varicela transmite-se por via cutânea (lesos da pele). Na fase inicial da doença pode ocorrer contágio através da via respiratória (tosse ou espirros). A incubação dura em média duas semanas. Após este tempo surgem pequenas lesões na pela que seguem uma evolução característica desde manchas, pápulas, vesículas e finalmente crostas. Inicio habitualmente na cabeça com progressão para o tronco. Os braços e pernas são menos atingidos. As lesões provocam muita comichão. A sua principal complicação é a infeção das lesões da pele por bactérias.

  • A criança é contagiosa desde um dia antes do aparecimento das lesões na pele até estarem todas em fase de crosta.
  • Habitualmente apenas é necessário baixar a febre, se existir, com paracetamol e aliviar a comichão com um anti-histamínico em xarope. Nunca deve dar a estas crianças medicamentos contendo ácido salicílico (como aspirina ou semelhantes) pois aumenta muito o risco de parecerem complicações graves. Para evitar a infeção das vesículas, as unhas devem estar cortadas rentes e mantidas limpas. O banho deve ser diário, de chuveiro (não de imersão) e a criança enxugada com uma toalha macia, sem esfregar. Não é geralmente necessária a colocação de qualquer produto sobre a pele. Os medicamente antivirais não têm interesse nos casos comuns da varicela. Devem ser utilizados apenas nos casos em que a doença pode ser grave, nomeadamente em bebés com menos de um ano, adolescentes com mais de 12 anos, crianças com doenças de pele ou respiratórias crónicas ou que de alguma forma tenham as suas defesas diminuídas. Alguns pediatras também aconselham o seu uso quando a varicela ocorre num segundo membro da família, pois nesta situação a gravidade das lesões é habitualmente maior.
  • A criança deve ficar em casa enquanto as lesões não estiverem todas em crosta, o que demora cerca de cinco dias após o início da doença. A ausência da escola é obrigatória por lei. A criança só pode voltar à escola com uma declaração médica que ateste a cura da doença e a ausência de perigo de contágio.

Existe uma vacina para prevenir a varicela, que não faz parte do Programa Nacional de Vacinação.

Escarlatina

A escarlatina é provocada por uma bactéria (estreptococo) que se transmite por via respiratória (tosse ou espirros). A sua incubação dura entre um a três dias, após o que a criança tem o inicio súbito de febre e dores de garganta. Por vezes, surgem queixas de dores de cabeça ou dores de barriga e gânglios dolorosos no pescoço. As amígdalas estão aumentadas e vermelhas, com pontos brancos ou membranas na sua superfície. Um a dois dias depois do início da febre aparecem as manchas, inicialmente no tronco e depois em todo o corpo. A pele fica vermelha, como se se tratasse de uma queimadura solar.

Muitas vezes a zona em torno da boca não é afetada. Ao fim de uma semana a pele começa a descamar. A língua pode ficar com um aspeto de framboesa.

  • É importante aliviar a febre e a dor para além do antibiótico (dose única de penicilina intramuscular ou antibiótico em xaropo durante sete dias).
  • A criança é contagiosa até ter completado 24 horas de antibiótico. Esta ausência é obrigatória por lei e a criança só pode voltar à escola com uma declaração médica que ateste a cura da doença e a ausência de perigo de contágio.

Febre escaro nodular (febre da carraça)

É provocada pela bactéria Borrelia que se transmite através da picada de uma carraça (que através da picada transmite a bactéria para a criança). Ocorre principalmente nos meses da primavera e verão.

A carraça pode estar localizada em qualquer local do corpo da criança, mas atrás das orelhas é um local habitual. Por vezes já se soltou e não é encontrada. Junto ao local da picada existem alguns gânglios aumentados. A febre é geralmente alta e difícil de tratar com os antipiréticos. As manchas no corpo são muitas vezes o mais característico. Normalmente aparecem nos punhos ou tornozelos e espalham-se rapidamente para todo o tronco, pescoço e face. Na maioria das vezes são também encontradas nas palmas das mãos e plantas dos pés. As manchas são pequenas, rosadas e não da comichão.

  • A doença não é contagiosa, pois é transmitida da carraça para a criança e não da criança para criança.
  • A primeira medida é retirar a carraça, se ainda estiver presa à criança. Habitualmente com éter ou álcool não é muito difícil. Por vezes é necessária a ajuda de uma pinça. Em segundo lugar é necessário combater a infeção e para isso é usado um antibiótico dado em xarope durante sete dias.

A evicção escolar deve manter-se enquanto persistir a febre.

Sépsis

Trata-se de uma doença muito grave que pode levar à morte ou a sequelas graves. Pode ser provocada por diversas bactérias, a mais importante é o meningococo, que se transmite pela via respiratória (tosse ou espirros).

A doença manifesta-se pelo início súbito de febre alta com calafrios e pequenas manchas vermelhas na pele. Estas são inicialmente muitos pequenas, tipo picada de alfinete (petéquias) mas rapidamente aumentam originando lesões escuras e extensas (sufusões). Estas manchas não desaparecem quando exercemos pressão sobre elas. Pode existir irritabilidade, prostração ou vómitos.

Estas crianças são sempre internadas no hospital, muitas vezes em unidades de cuidados intensivos. O tratamento é complexo e envolve a administração de antibiótico e o tratamento de possíveis complicações por lesão de vários órgãos (pulmões, coração, cérebro ou rins).

  • A criança deve ficar afastada de outras crianças até ao fim do tratamento. É obrigatório por lei. a criança só pode voltar à escola com uma declaração médica que ateste a cura da doença e a ausência de perigo de contágio.
  • Na suspeita de infeção por meningococo, os familiares que vivem na mesma casa e as crianças da mesma sala de aula devem fazer um antibiótico durante dois dias, como forma de prevenir o aparecimento da doença. Esta toma de antibióticos é obrigatório por lei e estas crianças só podem voltar à escola com uma declaração médica que atesta que iniciaram esta prevenção.

Algumas vacinas incluídas no Programa Nacional de Vacinação previnem alguns tipos de sépsis. Existem também vacinas não incluídas no Programa Nacional de Vacinação contra algumas destas bactérias.

O que fazer?

Depois de tudo isto, será fácil compreender três regras simples que todos os pais devem seguir quando um dos seus filhos surge com manchas no corpo.

Regra 1: Criança com manchas no corpo e febre alta devem ser observadas com urgência;

Regra 2: Crianças com petéquias devem ser observadas com urgência;

Regra 3: Nos outros casos pode ser dado algum tempo para observar a evolução da situação. Em caso de dúvidas deve contactar o pediatra ou médico assistente da criança.

Há manchas e manchas

Quando uma criança aparece com manchas na pele, é importante que os pais olhem atentamente para a criança e pensam na resposta a três perguntas fundamentais. Em função das respostas a criança pode ter de ir imediatamente para o hospital, pode ser necessário contactar o médico assistente ou pode ser aguardado algum tempo para ver qual a evolução que a situação vai ter. Quando o médico é contactado pelo telefone estas são também as perguntas que vai habitualmente fazer:

  1. Que tipos de manchas são?
  2. Quais as zonas do corpo atingidas?
  3. Qual o estado geral da criança?

Em conclusão

Na presença de manchas na pele o mais importante é os pais observarem o estado geral da criança. Uma criança com mais ou menos manchas que está sem febre, mantem o apetite, mantem os seus hábitos de sono e está bem disposta não sofre seguramente de qualquer doença grave. Se, independentemente do tipo de manchas, a criança está prostrada ou com febre alta ou vómitos deve ser vista de imediato por um médico. Nas situações intermédias, em que pode existir uma febre baixa, dores de cabeça ou alguma perda de apetite muitas vezes tudo o que há a fazer é baixar a febre e aguardar algum tempo (24 horas) para ver qual o rumo que a doença vai tomar. Se a criança tiver em contacto com outras que entretanto também adoeceram, por exemplo com varicela, o trabalho fica facilitado.

Outro aspeto importante é o tipo de manchas. Manchas rosadas que desaparecem com a pressão são geralmente inofensivas. As petéquias, apesar de poderem surgir em diversas situações, são as mais temidas pelo que podem significar.

Em caso de dúvidas, fale com o seu pediatra.

Fonte:

Paulo OOM (Pediatra)

Revista Pais&Filhos

número 289, fevereiro 2015

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