As doenças mentais não são um exclusivo dos adultos. Provavelmente a maioria não sabe, mas uma em cada 20 crianças tem algum tipo de doença mental, suficientemente importante para dificultar o seu relacionamento com os seus colegas, amigos e familiares. Na realidade, dizem os especialistas em saúde mental, a maioria das doenças psiquiátricas começa na infância e adolescência apesar de muitas apenas se manifestarem em pleno na idade adulta. Para ser mais específico, estima-se que metade de todas as doenças psiquiátricas do adulto começa até aos 14 anos e que dois terços já eram evidentes antes dos 24 anos. Algumas doenças podem mesmo começar mais cedo, como as que têm a ver com ansiedade exagerada, que estão muitas vezes presentes antes dos 10 anos.

As Crianças Também Podem Ter Ansiedade

Que tipos de doenças?

Como no adulto, as doenças mais frequentes podem ser agrupadas em três grandes grupos. O primeiro diz respeito às doenças relacionadas com uma ansiedade exagerada. Esta ansiedade pode ser provocada pelas mais diversas situações, como a separação de alguém querido (a ansiedade da separação), um medo exagerado (fobia) de algum animal ou objeto, ou um comportamento obsessivo, por exemplo com a limpeza e higiene. Todas estas situações têm em comum um sentimento de impotência em controlar os acontecimentos e uma ansiedade despropositada perante as mais diversas situações.

O segundo grupo diz respeito às crianças com problemas de impulsividade e que não conseguem controlar os seus instintos. O exemplo mais conhecido é o das crianças com hiperatividade e défice de atenção. Outros exemplos são o comportamento explosivo (“fervem em pouca água”) ou permanentemente desafiante (perturbação de oposição). Estas crianças podem ser um verdadeiro drama para os seus pais, irmãos e professores.

Por fim, o terceiro grupo das doenças mentais engloba as doenças que estão relacionadas com o humor. Tal como no adulto, a mais comum, de longe, é a depressão. Estas crianças são tristes ou ficam tristes facilmente perante os acontecimento mais simples do dia a dia.

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Ter ansiedade é normal

Antes de mais, é preciso separar o trigo do joio. A ansiedade, em doses normais, ajuda qualquer um. Ajuda-nos a estar alerta e preparados para o perigo e estimula as nossas capacidades físicas e intelectuais. Quem não se sentiu já ansioso antes de um exame? Ou na véspera daquela entrevista para um novo emprego?

Também nas crianças alguma dose de ansiedade, em determinadas alturas das suas vidas, pode ter efeitos benéficos. Tal como acontece com os adultos, uma pequena dose de ansiedade por ser estimulante e levar a criança a esforçar-se mais, a superar as suas dificuldades, a conseguir objetivos à partida mais difíceis.

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O problema surge quando essa ansiedade existe de forma despropositada, sem motivo aparente ou, tendo algum motivo, é de tal forma intensa que em vez de estimular, paralisa e impede a ação ou a distorce.

Todas as crianças experimentaram alguma ansiedade (saudável) ao longo da sua vida. Os bebés logo nos primeiros meses sentem ansiedade diante de estranhos. Com 18 meses as crianças sentem ansiedade se os pais se afastam ou quando um estranho se aproxima (principalmente se for o pediatra…). A partir dos cinco anos a criança sente ansiedade quando imagina monstros dentro do armário ou fantasmas debaixo da cama à noite. Nessa idade são frequentes os pesadelos que tantos sustos provocam na criança e nos pais. Mais tarde podem sentir ansiedade em relação a muitas outras coisas como do escuro, de ver sangue ou de animais, como os cães. À medida que a criança cresce, alguns medos desaparecem sendo substituídos por outros, mais adequados ao seu grau de desenvolvimento. Isto é referido muitas vezes pelos pais, que notam esta evolução a uma certa transformação naquilo que provoca medo à criança.

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Quando é um problema

Se a ansiedade é comum, e de certa forma até benéfica, só nos deve preocupar a ansiedade despropositada e que interfere com a vida da criança, impedindo-a de ser uma criança independente, realizada e feliz.

Alguns sinais podem ser esclarecedores de que algo mais importante se passa, como por exemplo quando a criança:

  • está muito nervosa em determinados situações
  • evita determinadas situações
  • procura modificar a sua vida de forma a não ser confrontada com aquilo que lhe provoca uma ansiedade exagerada
  • tem problemas em adormecer de forma sistemática
  • tem queixas de dores frequentes, apesar de não existir evidência de qualquer doença física, como dores de cabeça ou de barriga
  • numa situação de ansiedade fica com respiração acelerada, pálida e suada, mostrando uma reação exagerada ao que a rodeia.

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Como ajudar uma criança ansiosa

É muito importante procurar relaxar a criança. Para que ela se possa acalmar é útil mostrar que aquilo que ela sente até é normal, apenas exagerado. Conversar com a criança pode ajudar muito e pode ser feito de forma preventiva. Por exemplo, se vão sair à rua e é possível que se cruzem com algum cão, este pode ser um tema de conversa antes da saída. Geralmente isto é mais útil do que atitude de nada dizer e “depois logo se vê”. O problema é que quando a criança vê e identifica o perigo fica muitas vezes bloqueada e não consegue ser perfeitamente racional. Por isso é preferível falar destes assuntos quando não estão a acontecer. Para além disso estimular a autoestima da criança é fundamental. Uma criança segura de si mesma consegue vencer mais facilmente alguma adversidade.

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Alguns pais são muito desastrados nas suas tentativas de ajuda e, por mais que tente, apenas conseguem piorar a situação. Esperemos que depois de lerem este artigo consigam virar agulhas e agir de outra forma. Como exemplo, eis algumas coisas que não deve fazer:

  • nunca ser oportunista, o que só ajuda a criança a transformar um medo grande num medo descomunal, tipo “Se não comes a sopa sai um mostro do teu armário e leva-te”.
  • nunca troçar, como “Não me digas que tens medo dessa aranha tão pequenina”. Tudo é relativo e, para a criança, aquela aranha não é pequenina.
  • nunca desvalorizar, pois a criança vai sentir-se sozinha na luta com o seu medo e a sua ansiedade. É preciso abordar o assunto de frente, de forma preventiva, para que a criança tenha coragem para enfrentar a situação.
  • nunca exagerar. Se a criança tem medo de cães não dar uma volta muito maior para evitar passar num local onde existem um, isto só dá a entender à criança que o seu medo tem razão de ser.
  • nos casos mais resistentes, a ajuda profissional por um psiquiatra infantil, pode ser necessária, caso os pais estejam a fazer tudo bem feito mas o resultados temem em não aparecer.

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A criança obsessiva

Esta é uma forma de doença mental com a qual é muito difícil de lidar. A criança tem pensamentos repetitivos, que “não me saem da cabeça” ou “não consigo evitar” e, em consequência, adquire determinados comportamentos obsessivos, como se de rituais se tratassem. As mais conhecidas são as obsessões com a limpeza e a higiene que lavam as mãos repetidamente. Outro exemplo é o da arrumação em que a criança parece fanática do arranjo e passa horas a arrumar as suas coisas, sem nunca estar tudo “perfeito”.

Em todas estas situações a criança não consegue deixar de pensar e agir como se nunca as coisas estivessem a seu gosto, o que lhe provoca grande ansiedade e interfere com a sua vida normal. A repetição de determinada tarefa faz parte crucial do seu dia-a-dia. Em consequência, a criança fica com sentimento de culpa e frustração porque não consegue controlar os seus pensamentos e atos.

As obsessões mais frequentes dizem respeito a limpeza, arrumação, simetria das coisas ou medo das doenças. Consoante a sua obsessão, a criança adota um comportamento compulsivo que visa restaurar o equilíbrio e diminuir a ansiedade. São exemplos o lavar das mãos, lavar os dentes, verificar repetidas vezes que os trabalhos de casa foram realizados, desenhar inúmeras vezes a mesma figura, que nunca fica “perfeita”.

Na maioria dos casos os pais são levados ao desespero e o conselho é que, antes de chegar a esse ponto, discutam o caso com o pediatra. Se necessário, uma ajuda profissional pode ser útil.

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Fonte:

Paulo Oom, pediatra

Pais & Filhos, número 298, novembro 2015

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